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Reserva de gênero em concursos públicos

publicado em 5 de junho de 2017 - Por Dr. Luciano de Souza Siqueira

A categorização dos seres humanos pela cor de sua pele, sob a forma de políticas afirmativas, desde sempre gerou e continuará gerando questionamentos que acabarão sendo analisados pelo Judiciário.
Numa sociedade amplamente miscigenada como a brasileira, a definição exata de quem é negro, branco ou pardo, pode gerar distorções avaliativas em pessoas pertencentes ao mesmo núcleo familiar.
Num concurso público ocorrido o Estado do Rio Grande do Sul, isso foi levado a discussão judicial e que foi garantida a aprovação para uma candidata inicialmente não considerada “parda”
A Primeira Turma do Superior de Justiça garantiu a nomeação de candidata ao cargo de oficial de controle externo do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul, ao confirmar decisão que anulou ato administrativo que havia cancelado sua inscrição na lista específica para negros e pardos.
De acordo com o edital, para que o candidato pudesse concorrer às vagas destinadas a negros e pardos, deveria apenas declarar essa condição no ato da inscrição. Entre as cláusulas do edital do concurso, também estava previsto que a falsidade na autodeclaração do candidato implicaria a nulidade da inscrição e de todos os atos subsequentes.
A candidata teve a inscrição no concurso cancelada sob o fundamento de que não preenchia os requisitos necessários a concorrer às vagas destinadas a negros e pardos. O parecer da comissão de aferição dos requisitos para inscrição na reserva de vagas concluiu que, apesar de a candidata declarar ser neta de negro, só poderia ser considerada parda se tivesse pelo menos a mãe ou o pai negro.
O relator do recurso no STJ, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, entendeu que os requisitos analisados pela comissão não guardaram relação com o que estava previsto no edital e nem com a Lei Estadual 14.147/12, uma vez que foram estabelecidos de forma aberta e irrestrita pelos integrantes da comissão. Assim se manifestou:
“Se o edital estabelece que a simples declaração habilita o candidato a concorrer nas vagas destinadas a negros e pardos, não pode a administração, posteriormente, sem respaldo legal ou no edital do certame, estabelecer novos critérios ou exigências adicionais, sob pena de afronta ao princípio da vinculação ao edital, além de se tratar de criteriologia arbitrária, preconcebida e tendente a produzir o resultado previamente escolhido”.
De acordo com o ministro, a jurisprudência do STJ é firme quanto à necessidade de serem seguidas fielmente as disposições do edital, como garantia do princípio da igualdade.
Com esse entendimento, o Ministro anulou o ato que determinou o cancelamento da inscrição da candidata para restabelecer os efeitos de sua nomeação e, preenchidos os demais requisitos legais, garantir a posse no cargo de oficial de controle externo.
O estado do Rio Grande do Sul recorreu da decisão, mas a Primeira Turma, por maioria de votos, acompanhou o entendimento do relator.